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A língua está em mim, me perpassa, faz parte da minha formação como ser social inserido num grupo. Compõe ainda a minha própria formação acadêmica já que resolvi após o primeiro curso superior (Administração), cursar Letras. Essa língua me representa em todos meus conflitos, pois suas características são iguais as minhas, um ser multifacetado, de exterior sóbrio e estático, mas no íntimo um turbilhão em movimento. Assim como um rio congelado que apresenta a sua superfície estática, mas o seu interior está sempre em movimento, num curso perene. Capacidade de adaptação e compreensão com singularidade e regionalidades tolerantes como próprios à língua. Escrever é para mim, como respirar, sinto essa necessidade e é através da escrita como afirmou Aristóteles que transitamos desde o terror até a piedade de nós mesmos e do outro. Esse ofício da escrita nos eleva, nos projeta, nos ressignifica quando tocamos o outro com as nossas palavras, seja no universo ficcional, biográfico ou autobiográfico. Escrever é uma necessidade, escrever é transpirar no papel as nossas leituras.

sábado, 5 de maio de 2018

SERMO PATRIUS









No  poema Língua Portuguesa,  Olavo Bilac, poeta parnasiano, faz uma abordagem sobre a história da língua portuguesa, tema já tratado por Luís Vaz de Camões ( autor nacional de Portugal, considerado uma das maiores figuras da literatura lusófona e um dos grandes poetas da tradição ocidental.) , Este poema inspirou outras produções literárias, como o poema “Língua”, de Gilberto Mendonça Teles e “Língua Portuguesa”, do cantor Caetano Veloso.

Esta história é contada em catorze versos, distribuídos em dois quartetos e dois tercetos – um soneto – seguindo as normas clássicas da pontuação e da rima.

Uma análise semântica do texto literário, possibilita-nos perceber que o poeta, com a metáfora “Última flor do Lácio, inculta e bela”, refere-se ao fato de que a língua portuguesa ter sido a última língua neolatina formada a partir do latim vulgar – falado pelos soldados da região italiana do Lácio.

No verso dois, há um paradoxo: “És a um tempo, esplendor e sepultura”. “Esplendor”, porque uma nova língua estava ascendendo, dando continuidade ao latim. “Sepultura” porque, a partir do momento em que a língua portuguesa vai sendo usada e se expandindo, o latim vai caindo em desuso, “morrendo”.

Nos versos três e quatro, “Ouro nativo, que na ganga impura / A bruta mina entre os cascalhos vela”, o poeta exalta a língua que ainda não foi lapidada pela fala, em comparação às outras também formadas a partir do latim.

Olavo Bilac enfatiza a beleza da língua em suas diversas expressões: oratórias, canções de ninar, emoções, orações e louvores: “Amo-te assim, desconhecida e obscura,/ Tuba de alto clangor, lira singela”. Ao fazer uso da expressão “O teu aroma/ de virgens cegas e oceano largo”, o autor aponta a relação subjetiva entre o idioma novo, recém-criado, e o “cheiro agradável das virgens selvas”, caracterizando as florestas brasileiras ainda não exploradas pelo homem europeu. Ele manifesta a maneira pela qual a língua foi trazida ao Brasil – através do oceano, numa longa viagem através das caravelas portuguesas – quando encerra o segundo verso do terceto.

Expressando ainda o seu amor pelo idioma, agora através de um vocativo, “Amo-te, ó rude e doloroso idioma”, O poeta alude ao fato de que o idioma ainda precisava ser moldado e, impor essa língua a outros povos não era um tarefa fácil, pois implicou em destruir a cultura de outros povos.

No último terceto, quando o autor diz: “Em que da voz materna ouvi: “meu filho!/ E em que Camões chorou, no exílio amargo/ O gênio sem ventura e o amor sem brilho”, ele utiliza uma expressão fora da norma (“meu filho”) e refere-se a Camões, quem consolidou a língua portuguesa no seu célebre livro “Os Lusíadas”, uma epopéia que conta os feitos grandiosos dos portugueses durante as “grandes navegações”, confeccionada quando esteve exilado, aos 17 anos, nas colônias portuguesas da África e da Ásia. Durante esse exílio, nasceu “Os Lusíadas”, uma das oitavas epopéias mundiais.


sexta-feira, 13 de outubro de 2017

PRODIGIUM









O clássico mais célebre que traz a alegoria do monstro e monstruosidade inerente ao ser humano, talvez seja The Strange Case of Dr Jekyll and Mr Hyde, O médico e o monstro Robert Louis Stevenson.
Nessa obra percebemos o indivíduo e seus conflitos, preso num só corpo o convívio dual de criaturas distintas, uma humana e a outra bestial. É interessante perceber a construção desse personagem pelo autor: Robert Louis Stevenson em The Strange Case of Dr Jekyll and Mr Hyde, ilustre médico, percebe-se dividido entre duas personalidades, ambas, para ele, completamente verdadeiras. Uma é a do emérito doutor, filantropo respeitado e exemplo de conduta. A outra, reprimida durante toda a sua vida, é a do hedonista, que busca o prazer carnal, que comete crueldades e vilanias, sem responsabilidades. Busca, então, na ciência, a maneira de resolver esse impasse. A poção que permite a transmutação entre as personalidades é, ao mesmo tempo, amostra das incríveis possibilidades abertas pela ciência em acelerada evolução e exemplo da angústia de não saber até onde ela poderia ir, já que a invenção subjuga o próprio cientista, que não pode mais controlá-la. Ainda que de forma não premeditada, Stevenson transporta para a literatura o debate político e social vigente, (Karl Marx viveu em Londres de 1850 até sua morte, em 1883). Ao mesmo tempo que traz o progresso e a riqueza, a ciência traz a pobreza e a destruição, como se podia observar na própria Londres da época.  
A invenção do Dr. Jekill explicita ainda um tema importante relacionado à moral e à sociedade: o bem e o mal convivem dentro de cada ser humano. Mr. Hyde não ganha vida pela ingestão da beberagem, e sim é libertado do interior de Jekill, onde já vivia, embora reprimido.
Não é difícil encontrar evidências de uma tese sobre o consciente e o subconsciente nas entrelinhas dessa obra de ficção do final do século XIX. Para isso, basta ler o último capítulo do livro em que o médico, num momento de lucidez, narra em uma carta todo seu trabalho e pesquisa dos últimos anos. A escolha feita pelo autor do personagem como um médico, profissão tida como nobre desde a Grécia Antiga fundada com o juramento de Hiprócrates não é inocente.
O médico um indivíduo ético, sério comprometido com sua profissão que seria a de salvar vidas e curar o mundo de suas mazelas através da ciência vê-se num dilema.
No clássico de Stevenson, esse ser nobre é também um ser dual, guarda em si, uma criatura horrenda, mas qual seria esse propósito do autor? O de confinar num único corpo dois seres de natureza tão diferentes? O Médico e o Monstro?
Segundo Jeha (2008) Monstros corporificam tudo que é perigoso e horrível na experiência humana. Eles nos ajudam entender e organizar o caos da natureza e o nosso próprio. Nas mais antigas e diversas mitologias, o monstro aparece como símbolo da relação de estranheza entre nós e o mundo que nos cerca.
A partir dessa idéia, entendemos que no clássico o Médico e o Monstro o autor propõe a catarse do indivíduo através da manifestação da personalidade /alter ego do Monstro, para demonstrar que o ser humano não seria tão bom, tão perfeito como poderia se esperar.
O conflito psicológico apresentado na obra também demonstra a eterna luta do indivíduo contra sua natureza terrena/bestial e egoísta em contrapartida com os valores estabelecidos pela sociedade e dos dogmas da Igreja que si mesclam a esses valores sociais.
Sobre isso entendermos que a alteridade do indivíduo está sempre condicionada aos valores do Estado que na Idade Média era regido pela Igreja Católica, e hoje é tido como Laico, porém se apresenta na verdade como Científico, pois o governo é orientado pelas descobertas cientificas e avanço da ciência. Todo governo se apoia na ciência para governar.
E é nessa sociedade científica que nos é apresentado à nova concepção para Monstros e monstruosidades. Segundo Jeha o monstro como uma metáfora do mal: deixando um pouco de lado a criatura em si, sua aparência e deformidades para focar nas suas monstruosidades, aqueles atos monstruosos que as pessoas cometem. Podemos citar os grandes ditadores como: Stálin, Hitler, e o terrorista Bin Laden que tinham algo de bom, mas cometeram atrocidades, atos de crueldade que foram além do que se esperava de um ser humano.
O autor destaca que o cerne da questão é a capacidade do homem de exceder o limite da maldade e a que a literatura é um bom campo para analisar isso.
Se na obra de Stevenson, o médico e o monstro, inaugura a catarse do indivíduo na literatura da época, na atualidade esse monstro e essa monstruosidade é repensada, não tem lugar fixo nem definição estabelecida, o monstro para Jeha é um vazio que se pode preencher com vários medos, acusações, castigos. Ele pode ser uma criatura, uma pessoa ou mesmo um lugar.
Desse modo, entendemos que tais construções do monstro e monstruosidades fazem parte do indivíduo, e podem estar relacionadas a aspectos diversos como: forma de obter coesão do grupo, toda comunidade precisa ter união interna para agir contra um inimigo externo. Uma das maneiras mais fáceis de obter isso é usar a imagem do monstro, transformando o inimigo em monstro, é possível unir todos contra ele.
 O monstro pode ser resultado ainda, de uma falha no conhecimento humano-tanto no sentido científico, quanto moral e social, ou seja, aquilo que o homem não conhece ainda, tende a ver como monstruoso. Da mesma forma, a partir do momento em que se torna natural, passa a fazer parte da realidade das pessoas e deixa de ser monstro.
Assim o monstro é sempre caracterizado pela ideia de excesso, irreal e de anormal.

sábado, 15 de julho de 2017

CONCEPÇÃO DE LÍNGUA/LINGUAGEM, FORMAÇÃO DE PROFESSORES E ENSINO DE PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA (PLE)










            Segundo Oliveira (2007), a concepção de língua/linguagem adotada pelo profissional docente irá influenciar na sua atividade profissional. Dito de outra maneira, se o professor entender a língua/linguagem como um conjunto de sistemas formais, ele irá desenvolver a sua docência a partir dessa concepção de língua/linguagem, o que irá privilegiar certos aspectos linguísticos em detrimento de outros.
            Sobre o ensino do Português como Língua Estrangeira (PLE), a dinâmica se dá da mesma forma, no entanto, o mais coerente é que o professor seja capaz de utilizar as várias concepções de língua/linguagem conforme as necessidades dos alunos. Em se tratando de PLE, fica evidente que a concepção sócio-interacionista e uma abordagem que enfatize o método comunicativo trará maiores resultados no aprendizado desses alunos. Não podemos dissociar a língua da cultura durante a atividade docente, uma vez que a cultura perpassa a língua. Aprender uma língua estrangeira, ou uma segunda língua(L2) implica em  mergulhar na cultura dessa língua em questão.
             Segundo Mendes (2010), o caminho que nos favorece nessa atividade de ensino é a etnografia, que é a forma do professor investigar a comunicação humana em tempo real, através de sua atividade docente. Conforme Santos(2009)Isso se dá da seguinte forma: o professor ao mesmo tempo em que ministra a aula, ele avalia a recepção dos alunos diante das atividades propostas, dos materiais utilizados, do modelo de avaliação/exercício, e ao final esse docente irá propor melhorias ao seu próprio método de ensino ou abordagem, no intuito de otimizar a relação ensino-aprendizagem.
               Logo, a importância de não dissociar a língua da cultura no processo ensino-aprendizagem reside no fato de que a língua não é apenas a estrutura formal e sistematizada, mas compreende também a interação entre os indivíduos e essa interação se dá num contexto sócio-cultural que abarca implícitos que não podem ser ignorados na atividade entre os falantes.

sábado, 10 de dezembro de 2016

VIVÊNCIAS



            Se for só isso, terei sido feliz. 
O amor passou e acenou-me com a mão. Corri em carona e deixei-me conduzir.
            A alegria suspirou e senti o êxtase das sublimes emoções. Tentei parar o tempo, 
eternizar o momento. Segui acreditando no percurso da realização.
             Atravessei e continuo seguindo, se foi só isso, terei sido feliz;
Na felicidade do momento; a contento; do aprendiz; aprendendo a ser feliz!


domingo, 31 de julho de 2016

ALIENAÇÃO







                 Segundo Fanon (1951) não basta apenas mudarmos a nossa visão de mundo, para que deixemos de ser alienados, é necessário mudar o mundo. Para o autor a alienação colonial consiste na impossibilidade do indivíduo se constituir enquanto sujeito da sua própria história. Então, se estivermos impossibilitados de reagir à colonização, seremos sempre alienados, ainda que estejamos conscientes de tudo que acontece em torno de nós;(saibamos quem são nossos opositores/adversários).
                  Fanon pensou as consequências dessa  alienação de duas formas: subjetiva e objetiva; o indivíduo negro para ser aceito como humano deveria agir/pensar como os chamados "brancos'. Tal comportamento, segundo o autor, traria consequências objetivas (concretas) e subjetivas (psicológicas). Pois, embora o ser humano seja constituído de razão e emoção, a sociedade ocidental tende a separar a razão da emoção como duas coisas distintas, mais ainda, ao definir o indivíduo como ser humano, a sociedade ocidental afirma que o ser humano é a razão, pondo assim a emoção no campo da natureza, afirmando ainda  que há uma necessidade de controle dessa emoção por considerá-la uma  ameaça a razão.
                   O autor afirma ainda, que no Século XVIII, os Iluministas (europeus) definiram os humanos com base em si mesmo (tendo a si próprio como modelo), trazendo assim uma definição truncada (incompleta) que não contemplava o indivíduo negro, já que essa classificação iluminista englobava apenas o sujeito branco (humanidade)  representado pela razão, (que denotava valores como civilização, religião, cultura, tecnologia e o estado) e o corpo como algo a a ser dominado (domado/domesticado). Fanon chama atenção para as conclusões iluministas: se o branco é tido como humano, e o indivíduo que não é branco? Esse não é considerado tão humano assim.
Logo, para se humanizar o individuo negro teria que se embranquecer, inclusive através  do adestramento do corpo (comportamento, roupas, linguagem e até através das relações afetivas).
               Em sua obra  Pele Negra Máscara Branca, Fanon cita um exemplo intersexual para demonstrar o sofrimento psicológico como consequência subjetiva: "Da parte mais negra de minha alma, através da zona de meias-tintas, me vem este desejo repentino de ser branco. Não quero ser reconhecido como negro, e sim como branco. Ora — e nisto há um reconhecimento que Hegel não descreveu — quem pode proporcioná-lo, senão a branca? Amando-me ela me prova que sou digno de um amor branco. Sou amado como um branco. Sou um branco. Seu amor abre-me o ilustre corredor que conduz à plenitude... Esposo a cultura branca, a beleza branca, a brancura branca. Nestes seios brancos que minhas mãos onipresentes acariciam, é da civilização branca, da dignidade branca que me aproprio." (p.69). Nesse capítulo, o autor demonstra uma das formas do sujeito negro se apropriar da cultura branca através dessa relação amorosa.
               Percebemos assim, o sofrimento psíquico do indivíduo ao perceber-se negro num mundo regido por ideais branco e que não aceita o diferente dos seus padrões. O autor afirma ainda que tem algo que iguala homens e mulheres negros em relação a esse tema, que é: a busca por esse "outro" é mediada pelo racismo num lugar em que o branco é tratado como sinônimo de humanidade. Logo, esse negro, irá tentar ser branco (se apropriar desse embranquecimento) em vários aspectos, a exemplo da literatura, nos hábitos, costumes, porém essa tentativa torna-se limitada porque apesar do desejo de ser branco (agir /viver como branco), ele percebe que continua sendo negro, mesmo que ele acredite que é branco. (sempre será visto como negro).
               Fanon afirma  que algumas pessoas irão perceber que por mais que elas tentem ser negras, (viver e agir de acordo com sua identidade )elas não vão conseguir, outras não. Por outro lado, há ainda aqueles que amaram muito o mundo branco e agora percebem que não são aceitos. Esse amor dedicado ao mundo branco, torna-se-á ódio por tudo que representa esse mundo branco. O autor afirma ainda que esse ódio é bom pois, ajuda a desestabilizar a hegemonia branca. No entanto, ressalta que nenhuma luta política se faz pelo ódio, já que esse sentimento impede a percepção do sujeito sobre  as afinidades entre os indivíduos. Ao enxergarmos o outro como depositário de todas as agressividades (o corpo/ a agressividade/ a barbárie), deixamos de perceber a nós mesmos  como sujeitos do processo. Tentando explicar assim, todos os conflitos como culpa do outro, não identificando  a nossa responsabilidade como ator social (que reproduz os mesmos comportamentos errôneos ), então faz-se necessário superar esse ódio.
                O autor alerta ainda sobre o risco do sujeito negro aceitar essa dicotomia (branco-razão/ negro-emoção)  que o indivíduo branco estabeleceu afirmando que a razão é superior a emoção. Fanon considera perigoso para o indivíduo negro apenas inverter essa noção/conceito, pois o negro continuaria sendo emoção e o branco razão, no entanto, a emoção seria valorizada em detrimento da razão. O autor chama atenção para os debates sobre identidade, afirmando que tais debates só são produtivos se valorizarmos nossa identidade sem desvalorizar a identidade do outro.
                 Portanto concluímos que, para Fanon a luta não é identitária, nem pela preservação da cultura,  mas pela libertação do indivíduo e pela possibilidade do ser humano ressignificar  essa cultura.